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segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Untitled 11

Ela tirou as almofadas e os ursos de pelúcia que encobriam sua cama. Puxou a pontinha fina do cobertor e sentou-se. Como de costume, tirou os óculos e os guardou frente a uma escrivaninha velha que se encontrava encostada alí a anos. Pensativa, até fitou o livro surrado e de folhas amareladas, mas estava tão exausta que decidiu terminá-lo numa outra hora. Aos bocejos, tratou de colocar as pernas por dentro da coberta e sentindo-se aquecida, ajeitou o travesseiro pela ultima vez, enquanto Spike, seu cachorro, acomodáva-se aos seus pés.
Bang, bang, bang…
O Relógio antigo de madeira conservado frente a sala de estar, anunciava 23:00 horas. “Detesto esse barulho” - pensava ela. Após a morte da pobre tia Ana, por que diabos ficar com um relógio velho e barulhento? Tia Ana era uma mulher doce. Costumava ser uma daquelas tias que mimam os sobrinhos com zilhões de balas e histórias divertidas sobre princesas e seus adoráveis finais felizes. Às vezes, até mencionava belas capas e lindos cavalos brancos.
Bang, Bang, Bang…
Mas que diabos! “Ao invés do relógio, deveríamos ter ficado com o livro de histórias” - dizia ela apertando o travesseiro contra os ouvidos na tentativa de diminuir o barulho. Até Spike passara para debaixo da cama. A lua banhava o céu estrelado. Banhava as ruas vazias e o chão de seu quarto, agora, silencioso. Seria uma daquelas noites longas as quais você deseja que seu corpo seja desligado da mente. Corpo cansado mente pensativa. Deveria haver uma espécie de conexão direta entre as duas. “Minhas olheiras agradeceriam se eu pudesse dormir rapidamente” - ela sussurrou.
Isso já virara uma espécie de rotina. Essa coisa de encostar a cabeça no travesseiro, olhar para o teto e pensar em nada e em tudo ao mesmo tempo. Não a julguem, pois afinal, adesivos fluorescentes de estrelas colados no teto podem fazer a sua mente vagar por quilômetros…
“Quanta bobagem” - ela riu de si mesma. Então, puxou a coberta pra mais perto e abraçou um punhado dela, como se estivesse protegendo a pessoa mais preciosa do mundo. Suspiros tomaram conta do quarto quieto.
Diga-me, qual é a primeira coisa que você pensa antes de dormir e a primeira ao acordar? Talvez não seja tão difícil de responder, talvez não seja tão incomum assim. Digo, não são coisas que desejaria ter ou fazer. A pergunta certa seria: em quem você pensa ao encostar a cabeça no travesseiro?
“Quanta tolice!” - ela virou-se abruptamente dando as costas para o espaço fluorescente acima de sua cabeça.
Bang, Bang, Bang…
O relógio ressoava novamente.
Bang, ban, b…
Seus olhos foram fechando-se aos poucos a medida em que não se podia ouvir mais nada, exceto Spike ronronar pela ultima vez. Ainda havia muitos pensamentos a serem questionados. Mas resolveu guardá-los para uma próxima vez, uma próxima noite de insônia qualquer.

(Raphaela Sacchi)

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Untitled 10

Eu caminhava por essa rua sombria através de uma multidão que seguia no sentido contrário ao meu. Olhei para o relógio como se me interessasse saber as horas, mas na verdade, usei o gesto para me distrair da monotoneidade que era caminhar por alí. Nada me intrigava, a não ser um pequeno fiozinho dourado de sol que ia diminuindo aos poucos a medida que o grande muro de pedras o encobria. Um sopro em meus ouvidos: minha pele em tom de repulsa, anunciava a chegada do vento que dançava em volta de meu corpo, me entorpecendo, me fazendo congelar. Cruzei meus braços para tentar me aquecer, mas numa tentativa fracassada. Entenda, era Maio, somente alguém tão estúpido quanto eu para esquecer um agasalho em um mês como esse. O escuro da noite engolira cada gota do doce céu azul de outono. Ja se podia notar uma enorme quantidade de vaga-lumes piscando pelo manto negro (ou seriam estrelas?). Tentando não pensar no frio, continuei a minha caminhada sem sentido. Ja não haviam mais calçadas. Somente ruelas as quais davam acessos a tantos outros becos. Uma vez ou outra, notava olhares curiosos vindos de janelas entreabertas. Crianças descalças pulavam e sorriam em torno de um grupo de meninos que jogavam bolinhas de gude. Sem se preocuparem com nada, olhavam aquelas pequeninas esferas de vidro. Pra muitos, sem sentido. Mas pra eles? Ah, eram cristais que se chocavam continuamente, de um valor inimaginável. Desviei o olhar tentando lembrar a ultima vez que algo tivesse significado tanto pra mim. Quanto mais fechava meus olhos e me esforçava, menos me recordava. Resolvi abrí-los, mas ja havia pisado numa poça d'água que se encontrava logo a frente. Talvez eu devesse parar e xingar o mundo com palavras horrendas e dizer o quanto aquele mísero punhado de água havia estragado a minha noite. Mas pensando bem, a única coisa no qual realmente tive certeza naquele momento, é de que meus pés e pernas se encontravam tão imensamente frios quanto os meus braços. Mais um sopro, mais um sussurro. O vento havia tirado o dia pra me testar. Sentei-me á beira de um banco aos pedaços que se encontrava próximo á um parque. Silencioso, exceto por um balanço, que insistia em ranger a medida que o sopro da noite incidia sobre ele. Meus pensamentos acompanhavam seu rítmo lento e contínuo, assim como meu coração. Rangendo, lento, contínuo... Mesmo que frio, em um lugar qualquer, num tempo qualquer, ainda batia, ou ao menos tentava. Ja era tarde. Logo acima, fitei-os novamente: os vaga-lumes (ou seriam estrelas?). Fiz um pedido, mas ja nem me lembro qual...
(Raphaela Sacchi)