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domingo, 25 de setembro de 2011

Querido travesseiro, peço-lhe desculpas

As pessoas, normalmente, conversariam com paredes ou olhariam para o teto sussurrando meio mundo de amarguras e tristezas. Mas ao meu ver, nada mais justo do que oferecer as mais sinceras desculpas a você, que tanto tem me suportado.
Quando menina, relatava sobre sonhos e os escrevia em pedaços de papel, que foram se perdendo ao longo do tempo através da razão. Sinto saudades de quando tudo se resumia a coraçõezinhos tortos no fim de cada capa de caderno da sexta série.
Achei que tivesse me perdido em meio a essas pilhas de papeis coloridos e foscos. A medida em que fui traçando novos rumos, deixei pra trás os outros rascunhos de minhas historias espalhadas pelas estantes. Acabei arquivando sentimentos e verdades dentro de gavetas e paginas de livros surrados.
Querido travesseiro, peço-lhe perdão.
Por todas as vezes em que o amassei, virei e revirei nessas ultimas noites mal dormidas.
As pessoas, normalmente, descontariam a raiva num despertador as 5 da manhã. Mas ah, querido amigo... Tem sido tão difícil fechar os olhos a noite.
Há pensamentos incômodos martelando a alma na pretensão de crucificá-la. Pobre alma, alma perdida, áurea acinzentada. Quase não áurea, sem vida...
Estou te abraçando muito forte?
Sinto por isso também.
Que tal assim, mais afastado. Cabeça mais pro lado, pensamentos absortos, perdidos no tempo. Deixe-me sussurrar nas dobras das fronhas que o envolvem as mais belas juras de amor.
Querido travesseiro, posso virá-lo ao contrario?
Que os pedacinhos de suas espumas e as costuras detalhadas, filtrem o marejar de meus olhos. Sim, eu disse marejar, não lacrimejar.
Ouve o barulho? Não é o telefone.
É a chuva percorrendo o rosto.
Caminha fina, ácida, fria. Acumula no copo entre as mãos.
Dissipa aos poucos, esvaíra quando menos se espera.
Respira fundo.
Mais uma vez.
Uma terceira, por garantia.
Abraça-me forte, querido amigo. Deseje-me sonhos felizes, ou apenas fique.

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Era a última tarde de inverno

Em meio ás ultimas folhas secas espalhadas pelo chão, havia o primeiro traço de vida de primavera que insistia em se manifestar. O botão de lírio branco podia acalentar até mesmo a alma mais vazia daquele dia. O rouxinol, com seu canto triste, despedia-se da imensidão dourada que encobria o horizonte. E ali, envolta a tanta solidão, ainda encotrava-se a mais completa doçura.
Havia uma garota. Com a pele corada, os lábios rosados. Não havia sorriso: apenas uma linha reta que não definia expressão alguma em sua face. Seus cabelos eram dourados e os olhos tão castanhos quanto favos de mel. Era como se abelhas tivessem comandado a construção de cada pigmento tão delicadamente quanto o ato de colher o pólen das flores do campo.
Não havia beleza imensurável. Ela era encantadora por si só. Trazia consigo olhos expressivos e um pedaço de papel amassado por entre os dedos. Nessa tarde, sentei-me ao seu lado, como de costume. Conversáva-mos sobre tudo. Sobre a fome no mundo, sobre as novas bandas de rock progressivo, ríamos das coisas convencionais que aconteciam.
Não víamos o tempo passar. As nuvens se movimentavam, as gramíneas e as copas das arvores balançavam num ritmo calmo e silencioso. Seus cabelos ao réu batiam nos ombros de jeito gentil, e quando o faziam, exalavam um cheiro de camomila que enchia o meu coração.
Nós continuamos ali. Mãos apoiadas no chão, a três centímetros uma da outra, mas sem intenções. Ao menos por parte dela. Já eu, me sentia tão acalentado com o seu riso, que tinha vontade de abraçá-la somente por existir... E eu ficaria ali, poderia perder a minha vida inteira nesse momento.
Coloquei meu casaco em volta de suas costas, aqueci-a. Ventos de setembro são contrários aos ventos de março: varrem vestígios dos amores mal sucedidos de Junho a Agosto. Ela encolheu os ombros e sorriu. Apertou-o mais contra o corpo. Voltou a olhar pra frente.
Sabia que naquele momento, seus pensamentos já não eram mais meus. Não sei se cheguei a comentar, mas, por varias vezes, pude sentir seus anseios. E naquela tarde...
- Eu o amo.
- Eu também a amo...
- Ela quem? – Ela perguntou curiosa.
Tive vontade de dizer “você”, mas menti. Menti descaradamente...
- Não importa. Não se pode confundir certas coisas.
- Por que não?
Ela sempre com seu jeito curioso.
- Eu não sei.
Ficamos em silencio por alguns minutos. Pela primeira vez, não havia o que dizer. Ficamos ali, ainda a três centímetros um do outro, pensando em nossas respectivas paixões: meu próprio sonho se dissipando entre os dedos; meu próprio sonho almejando ser o sonho de outra pessoa.
Então dois anos se passaram.
Seguimos rumos diferentes.
Nunca mais soube dela e já nem me lembro mais o motivo. A única coisa que me restou, foi uma saudade sem medidas do tempo em que passávamos juntos. Mas já não podia mais sentir o seu riso, já não me recordava mais do som ou se quer conseguia distinguir o seu cheiro.
Havia um numero em minha agenda. Nela, constava uma seqüência de números que eu nem sabia se ainda a pertenciam, assim como nunca pude ter certeza se o seu coração um dia fora meu. Passei aproximadamente 700 dias a base de álcool e fumaça. Havia amigos e grandes festas. Muitas das vezes, acordei em lugares desconhecidos e ao lado de pessoas que mal me recordava.
Em meio a restos de cigarros e cacos de vidros espalhados pelo chão, ia catando meus pertences em cada um dos cantos. Enquanto procurava as chaves do carro e seguia de volta pra casa, ia pensando pelo caminho onde havia deixado a parte que completava o meu coração. Restava sempre esse vazio no fim das contas...
Certo dia, nem me lembro o motivo. Digitei uma mensagem curta me desculpando por algo que por ventura tenha acontecido.
Obtive uma resposta curta e simples.
Essa resposta mudou a minha vida.
O que me entristece, caro leitor, é que mesmo depois disso, ainda não nos reencontramos.
E sim, eu ainda a amo.
Tive a oportunidade de dizer, fiz com que ela soubesse. Ela retribuiu.
Trocamos juras, cartas, presentes, sonhos, tudo.
Até os corações.
Hoje, porém, após todos os contratempos, ainda continuamos fortes. Nos irritamos, a saudade não conseguiu ser suprida como nos velhos tempos.
Por isso encontro-me sentado á minha cama, nessa noite de inverno tão esplendorosa. Permita-me ressaltar o quão lindo e silencioso encontra-se o céu e as estrelas, aqui, pela janela do quarto.
Sinto a falta dela.
Escrevo nossa historia nesse bilhete pra que ela possa sempre se recordar dos desafios aos quais passamos juntos ate hoje. Grito em palavras a dor de minha saudade sem fim.
Não haverá mensagens nessa noite, não haverá ligações ou juras de amor antes de dormir. Haverá silencio e amor.
Assim como haverá outros dias e outros bilhetes e outras historias. Mas somente nossas.
Não somos um ciclo, somos uma linha tênue entre o meio e o interminável. Não tivemos começo, não suportaremos um fim. Somente um “eu sinto a sua falta” até que venha o próximo verso.
Bons sonhos, menina.
Deixo aqui um beijo,
e o meu coração.